A dificuldade em estabelecer limites
Existe uma linha tênue entre o discernimento quanto à importância dos limites e sua prática. O saber pode ser definido como um processo que envolve um conhecimento empírico somado às inúmeras informações que recebemos acerca de um determinado assunto. A prática vai além disso, pois engloba a capacidade do indivíduo de exteriorizar por intermédio dos comportamentos o que aprendeu. Normalmente, é um processo difícil por envolver condições emocionais limitadoras, ou seja, adultos que têm a exata noção do que precisa ser feito, podem não dar conta de realizá-lo em razão dessas questões restritivas.
Como exemplo, podemos citar o efeito devastador do sentimento de culpa no tocante à educação dos filhos. Muitos pais se tornam reféns dos desejos intermináveis da prole, regados aos apelos publicitários na tentativa nociva de compensar sensações negativas neles mesmos. E as razões para se “penitenciarem” são inúmeras, como ausência física em razão da profissão, tentativa de evitar que o filho seja marginalizado por não possuir um determinado produto, enfim, a prevalência da cultura do TER em detrimento do SER em boa parte das famílias da atualidade.
Quando e como começa a educação financeira
A educação como um todo, deve envolver, primordialmente, a coerência entre o que é dito e o que é praticado, e para tanto não há idade, mesmo em se tratando do dinheiro. Um bebê não tem discernimento sobre o objeto em questão, mas já é capaz de perceber e internalizar o sistema de crenças, bem como as atitudes dos pais.
Momentos lúdicos envolvendo atividades de troca desde tenra idade podem introduzir conceitos simples sobre o valor das coisas. No que se refere ao dinheiro, propriamente dito, a mesada ou semanada podem ser muito eficazes no tocante ao manuseio do recurso financeiro e o momento mais adequado é quando a criança começa a desenvolver aptidões para as operações de somar e subtrair, entre 5 e 6 anos. O valor pode ser estabelecido de acordo com a idade da criança, aumentando a cada aniversário.
É importante que a criança vincule a mesada à idéia de mérito e isso deve ser explicado a ela. Para receber é necessário que a associe a pequenas responsabilidades, como não deixar brinquedos ou roupas espalhados, por exemplo. Isso introduzirá, para o futuro, a noção sobre salário. Mas atenção quanto a não vinculação da mesada a questões escolares (notas, tarefas, trabalhos). Estudo é obrigação, portanto não deve fazer parte de negociações.
O estabelecimento de metas para poupar também auxilia no tocante à educação financeira. A criança precisa saber com o que ela gostaria de gastar seu dinheiro e, portanto, por quanto tempo deverá poupar para adquirir o que deseja. Ao atingir seu objetivo, o adulto poderá pontuar sobre como a mesma se sentiu com a experiência de poupar para finalmente comprar o que almejava.
Outro aspecto importante é o envolvimento das crianças no momento da elaboração da lista de compras e também em sua execução. Muitos adultos não apreciam levar os filhos ao supermercado e deixam passar a oportunidade de ensinar, na prática, questões sobre o que verdadeiramente é necessário ou não. Reflexões como: “Esse produto é realmente importante e saudável?”, “Você pode escolher entre esse ou aquele, mas não os dois”, “Por que você quer comprar isso?”, “Veja, esse é semelhante aquele e mais caro apenas por causa da marca.” entre outras, possibilitam o desenvolvimento de um discernimento a respeito do que realmente é importante a criança levar para casa e para a vida.
A relação ensino-aprendizagem não se estabelece apenas em função de objetos que deliberadamente quem que se coloca na condição de educador pretende explorar, mas de igual modo e especialmente daqueles que decorrem de suas atitudes e comportamentos, para cujo resultado concorrem os conteúdos psíquicos do adulto (sentimentos, traumas, crenças, valores).
Faz-se necessário o exercício da auto-observação quanto à forma de se relacionar com o dinheiro para que os ajustes aconteçam, primeiramente nos pais. Uma postura leviana ou de desperdício em relação aos recursos disponíveis – e nesse aspecto importa reconhecer que independe o estrato social em que se situe quem a adota – induzirá fortemente uma tendência à leviandade e ao desperdício.
Para que resultados mais consistentes se produzam, deve-se buscar as origens das necessidades que mobilizam o abuso ou o emprego desarrazoado do dinheiro, as mais das vezes relacionadas com o impulso de completar uma lacuna emocional, raramente preenchida.
Ana Virgína Almeida Queiroz - CRP: 01-7250