27 de jan. de 2012

Um olhar para a depressão


O funcionamento emocional e fisiológico  estão bastante interligados, o que nos limita a dimensionar as causas da depressão como de origem física ou psicológica.  Essas dimensões são constantemente afetadas pelas relações sociais e pelos acontecimentos no ambiente, uma vez que a aprendizagem interfere na estrutura cerebral e vice-versa.

A depressão é diferente do estado deprimido, o qual pode ser resultado de fatos corriqueiros que nos causam sentimentos de tristeza ou estados de melancolia, mas que não se instalam por muito tempo. O estado deprimido faz parte da dinâmica da vida.

D
o ponto de vista psicológico, a depressão pode ser vista como um sintoma referente ao distanciamento do verdadeiro “eu” (self), originando na infância, em decorrência do medo da rejeição e da perda do amor. Da experiência clínica, observa-se que, na história do depressivo não raro existem episódios que resultaram em frustração, raiva e culpa frequentemente reprimidas e, no presente, a sensação de ser uma fraude, uma farsa, associada a uma tendência variável em intensidade de descrença em si mesmo, além do temor do momento em que descobrirão (inclusive o próprio depressivo) a verdade sobre ele. Sente que foi usurpado de seus direitos de amor incondicional, de aceitação e de reconhecimento.

Comumente, são pessoas boas, servis, que costumam agradar os outros e se cobram a perfeição e o sucesso, favorecendo, em alguns casos, que os demais ao seu redor passem a depender delas como forma de se sentirem valorizadas. São carentes e a dúvida sobre se seriam amadas se fossem “verdadeiras” (com impulsos negativos inclusive) está sempre latente. Cedo ou tarde, se deparam com a realidade de que sua importância é resultado do que fazem e não do que são. É justamente nesse momento que eclode a depressão e que algumas pessoas procuram a resolução da dor por intermédio de automedicação, uma reação comum, pois instintivamente querem fugir da dor, mas extremamente perigosa, pois além de não resolver o problema, pode favorecer recorrências cada vez mais intensas, com riscos extremos como o suicídio.

Quando o sentimento de grandiosidade, que é a ilusão de ser aceito, reconhecido e amado, quando o que é admirado são seus feitos, cai por terra, os episódios depressivos vêm auxiliar o indivíduo, pois enquanto a grandiosidade camufla a depressão a cura se torna inviável. Em reforço a essa idéia, recente reportagem da revista “Galileu” (maio/2010) sobre a doença relatou casos de pessoas que só conseguiram a melhora quando passaram a aceitar e a entender o que estava acontecendo, libertando-se do preconceito em relação à enfermidade. A depressão “obriga” um olhar sobre essa dor, germinada na infância e abafada diversas vezes em prol da necessidade de outras pessoas, a exemplo do menino que assume o papel de “homem da casa” para suprir a ausência da figura paterna em caso de morte ou de separação e, ainda, da menina que cede aos assédios sexuais de um familiar abusador para suprir as dificuldades da personagem a quem caberia essa função.

A depressão surge para sinalizar que algo não está bem e que precisa ser revisto e tratado adequadamente (acompanhamento psiquiátrico, medicamento e psicoterapia). Alice Miller (1997) explica que no processo de cura a pessoa terá a possibilidade de entrar em contato com o sentimento de que nunca foi amada pela criança que era, mas usada por suas qualidades, sucessos e realizações. Perceberá que sacrificou sua infância por um “amor” recebido como pagamento, mas que a deixa de mãos vazias, pois é referente ao seu falso self. A libertação da depressão devolve a vitalidade, a autenticidade e a possibilidade de viver de forma espontânea os sentimentos que fluírem a partir do tratamento, mas vale ressaltar que não gera a ausência completa de sofrimento ou uma alegria infinita.

E, afinal, o que se lucra com isso? Possibilidade de maior satisfação nas escolhas, relações verdadeiramente amorosas, nas quais haja compreensão e aceitação das limitações próprias e alheias, convergindo para uma forma saudável de lidar com a doença, com a valorização de suas mensagens e de seus apelos para a transformação, em uma longa e contínua busca do verdadeiro eu.

Suporte bibliográfico:

· O drama da criança bem dotada – Alice Miller / 1997
· Depressão em adultos – Anton Tolman / 2009
· O lado bom da Depressão – EriKa Sallum, revista Galileu / maio de 2010, n° 226.

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